segunda-feira, 30 de abril de 2012

O Rapto

Bastava o vento frio para gretar a pele de quem tinha que labutar no exterior, o céu estava bem limpo e o sol incandescente como no dia mais quente do ano, mas naquela manhã não aquecia. Não seria esse pormenor que o reteria em casa, apesar de pouco dado a tanto frio, saiu como em todas as manhãs, desta vez mais entusiasmado que o costume. O vizinho com quem se cruza diariamente reconheceu-lhe na face esse contentamento e uma expressão que ao longo destes anos todos nunca vira tão marcada. Devia ser toda aquela satisfação que o aquecia naquela gélida manhã, pensou o vizinho que tardou um pouco mais a sair de casa. 
Entrou no seu carro e seguiu viagem num percurso também pouco usual, estacionou de seguida numa zona de bonitas moradias. Com o sorriso com que acordara, esperou calmamente  por quem tinha decidido dar uma boleia. Um vulto surgiu na porta da casa defronte do sítio onde estacionara. Antes de sair do carro e escrever um pequeno bilhete apenas disse entredentes, com um sorriso ainda mais aberto, "Hoje vais perceber o que nos custa o dia a dia!".    


Texto escrito num dia gélido de Inverno após este: Passos .

terça-feira, 10 de abril de 2012

10h57- 10 de Abril

A sua tristeza passou para as nuvens que desde manhã se acinzentaram. Estacionado num bairro improvável de uma pequena cidade ouvia apenas de fundo as notícias que já tinham sido repetidas vezes sem conta no rádio e duas vozes graves à conversa, que aumentavam a distância do seu mundo para o real.
Na chapa do veículo soam as primeiras gotas de chuva e as vozes graves desaparecem simultaneamente. A sua espera para não se sabe bem o quê continua, cada vez mais absorto sente-se a esvaziar, tudo se afasta e funde-se com a tonalidade da atmosfera.