Bastava o vento frio para gretar a pele
de quem tinha que labutar no exterior, o céu estava bem limpo e o sol
incandescente como no dia mais quente do ano, mas naquela manhã não
aquecia. Não seria esse pormenor que o reteria em casa, apesar de pouco
dado a tanto frio, saiu como em todas as manhãs, desta vez mais
entusiasmado que o costume. O vizinho com quem se cruza diariamente
reconheceu-lhe na face esse contentamento e uma expressão que ao longo
destes anos todos nunca vira tão marcada. Devia ser toda aquela
satisfação que o aquecia naquela gélida manhã, pensou o vizinho que
tardou um pouco mais a sair de casa.
Entrou
no seu carro e seguiu viagem num percurso também pouco usual,
estacionou de seguida numa zona de bonitas moradias. Com o sorriso com
que acordara, esperou calmamente por quem tinha decidido dar uma
boleia. Um vulto surgiu na porta da casa defronte do sítio onde
estacionara. Antes de sair do carro e escrever um pequeno bilhete apenas
disse entredentes, com um sorriso ainda mais aberto, "Hoje vais
perceber o que nos custa o dia a dia!".